Olá, *|NOME|* O Imds iniciou em abril deste ano uma parceria com o governo do estado do Piauí, formalizada a partir de um Acordo de Cooperação Técnica (ACT) com a Secretaria de Planejamento. A finalidade do acordo é dar, durante quatro anos, suporte técnico nos temas de saúde infantil, prevenção à violência e educação. O primeiro plano de trabalho tratará do monitoramento e da avaliação da política de universalização do ensino de tempo integral no estado. O Piauí já conta com essa modalidade em 70% das escolas da rede estadual e quer chegar a 100% nos próximos anos.
A maioria dos alunos brasileiros da educação básica fica na escola em torno de quatro horas e meia por dia de segunda a sexta. O Plano Nacional de Educação (PNE), no entanto, busca o aumento dessa carga horária. O último PNE, referente ao período entre 2014 e 2024, já estabelecia como meta a ampliação da oferta do ensino em tempo integral (carga horária de ao menos sete horas diárias) para 50% das escolas e 25% dos alunos da educação básica. Para entender de que maneira esse tipo de política influencia a mobilidade social, torna-se necessário ter clareza sobre o que as horas adicionais de estudo representam em termos do uso do tempo do aluno e quais alunos se beneficiam dessa mudança.
No ensino médio, o estado de Pernambuco realizou uma expansão da rede de escolas de ensino médio em tempo integral entre 2008 e 2014. O projeto educacional tinha como objetivo melhorar o desempenho acadêmico e preparar o jovem para o mundo do trabalho e para a vida. Concretamente, isso incluía o aumento da carga horária das disciplinas convencionais, aulas de reforço, sessões de estudo em grupo e disciplinas novas como empreendedorismo, direitos humanos e projeto de vida –uma disciplina na qual os alunos desenvolvem o autoconhecimento e planejam sua vida pessoal e profissional. Naquele período, o estado expandiu a rede em tempo integral e semi-integral a fim de atingir a meta de ter escolas com essas características em todos os municípios pernambucanos. Os impactos dessa expansão incluíram a melhoria do desempenho escolar e da nota do Enem e uma redução na taxa de homicídios de jovens de 15 a 19 anos nos municípios contemplados, nos três anos subsequentes à implementação (ver aqui). Esses resultados vão na mesma direção de outras avaliações na literatura internacional de experiências de implementação ou expansão do ensino em tempo integral com aumento do tempo de aula nas matérias convencionais, como mostram avaliações de impacto de experiências do México (aqui) e Uruguai (aqui). No caso do Chile, a introdução do ensino em tempo integral também significou uma redução significativa de gravidez na adolescência e na criminalidade entre jovens (como mostrado neste artigo). Para este caso, também se observa efeitos sobre a renda do trabalho no início da vida adulta daqueles jovens expostos a mais tempo em sala de aula (veja este estudo para mais detalhes).
Apesar desses resultados animadores, existe um ponto de atenção importante: a introdução do ensino em tempo integral pode ser mais ou menos inclusiva, a depender do seu desenho. Quando há um aumento ou aprofundamento do conteúdo ensinado sem que haja apoio para que os alunos com dificuldades no aprendizado acompanhem essa mudança, os alunos de pior desempenho podem não se adaptar. O aumento da carga horária também pode implicar a saída dos alunos do ensino médio que precisam trabalhar para complementar a renda familiar. Isso não é necessariamente um problema se a intenção for criar um número pequeno de escolas de elite no sistema público para que alunos de alto desempenho em famílias de baixa renda possam ter melhores oportunidades. Em São Paulo, as escolas em tempo integral no ensino fundamental II e no ensino médio tiveram um salto no desempenho, mas uma redução no número de alunos, com migração dos estudantes de pior desempenho (mais informações aqui). Como há um número pequeno dessas escolas, os alunos que saem contam com opções de colégios públicos próximos em tempo parcial. No entanto, se o objetivo for nos aproximarmos cada vez mais da universalização do ensino em tempo integral, é preciso desenvolver formas de incluir alunos mais vulneráveis e com baixo desempenho. Afinal, eles precisam de uma escola que seja capaz de atender suas necessidades. Essa parceria com o governo do Piauí na estratégia do ensino em tempo integral permitirá ao Imds atuar diretamente em um instrumento promissor para a melhoria da transição escola-trabalho, especialmente para os jovens provenientes de lares socialmente mais vulneráveis, com esperados impactos positivos permanentes na renda futura. Além do tema, o acordo é o primeiro que fazemos com um estado da região Nordeste, o que muito nos orgulha. Até a próxima "Carta do Imds"! Paulo Tafner Diretor-presidente |