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2023 - Edição 09 | 10 de janeiro

Programas precisam ser focalizados para bem cumprir suas funções

É fundamental capacitar gestores, estabelecer protocolos de ação e medir com frequência o desempenho das unidades de atenção básica

Olá, Leitor

    Choques não afetam igualmente os lares e as famílias de uma sociedade. Eles variam em frequência e/ou em intensidade. Por isso, para bem cumprir suas funções, é necessário que os instrumentos utilizados pelos sistemas de assistência social sejam focalizados. As primeiras medidas do governo federal com relação ao Programa Bolsa Família (PBF), que reincorporaram o benefício variável por criança, parecem ir na direção correta: tendo a pobreza infantil aumentado em 2021 (último dado disponível neste painel – selecione série histórica e a linha de pobreza), o aumento do valor individual do programa para famílias com mais crianças repõe a focalização perdida em 2022 (Lei 14.342, maio de 2022).

    Uma política social que mire no aumento da mobilidade social, especialmente na base da pirâmide, deve ir além de ajustes pontuais no PBF. Por um lado, complementando a transferência de renda para o público já atendido pelo programa com ações que subsidiem a acumulação de capital humano das crianças e jovens e que promovam a inclusão produtiva dos seus responsáveis. Por outro lado, o público-alvo para programas de apoio não deve se resumir àqueles classificados como pobres pelo PBF: o Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico, instituído pelo Decreto 3.877 de julho de 2001) deve ser mais bem aproveitado como ferramenta para aqueles que, não sendo pobres, ainda assim são vulneráveis e necessitam de suportes variados.

    O Brasil tem um arcabouço institucional adequado para a implantação de uma lógica integrada do atendimento social à família, instituído pela Lei 8.742 de 1993. A proteção social básica prevista pelo Sistema Único de Assistência Social (SUAS) faz uso dos Centros de Referência em Assistência Social (CRAS) como unidade de atenção mais capilar, gerido pelos municípios. O mau funcionamento do CRAS, quando ocorre, torna inefetivo qualquer programa social, por mais bem desenhado que  seja.

    Um exemplo é o Programa Criança Feliz (PCF, do decreto 8.869 de outubro de 2016), uma política pública federal de visitas domiciliares voltadas para a estimulação cognitiva e socioemocional na primeira infância, inspirado no Reach Up and Learn da Jamaica da década de 1970, programa que apresentou impacto positivo e duradouro sobre as crianças atendidas (vinte anos depois, jovens beneficiados quando crianças ganhavam 25% a mais do que o grupo de controle). Ou seja, o PCF é um programa cuja matriz lógica segue o melhor da política social.

    No caso brasileiro, uma avaliação experimental de impacto do PCF, conduzida entre 2019 e 2021, revelou que o programa não apresentou, nos 30 municípios em que foi avaliado, efeitos positivos sobre desenvolvimento infantil (veja aqui). Algumas pistas para a ausência de resultados vêm da descrição da operacionalização do programa no âmbito dos CRAS. A avaliação revela ter havido um número insuficiente de visitas para geração de impacto (menos de uma  visita por mês), deficiências na gestão (em especial, alta rotatividade do corpo de coordenadores municipais e dos próprios visitadores, que frequentemente tinham contratos temporários) e baixa aderência das visitas ao protocolo do programa. Enfim, uma operacionalização ruim provavelmente reduziu ou até anulou a efetividade do programa que estimula uma interação produtiva entre cuidadores e bebês.

    Outra atribuição possível dos centros é a de atuar como facilitadores do acesso prioritário de famílias em situação de pobreza a políticas públicas e programas sociais do terceiro setor. Com efeito, existe uma ampla gama de serviços providos pelo organizações não governamentais. Centros de Referência funcionaram, nesse caso, como provedores de informação para as famílias e como matchmakers.  Contudo, quando implementado na Colômbia no fim dos anos 2000, um programa de assistência social intersetorial chamado Juntos, não teve impacto nas dimensões esperadas. Também lá as famílias contempladas receberam poucas visitas e houve alta rotatividade dos gestores responsáveis (ver aqui).

     Casos como esses sugerem a importância de ações do governo federal no sentido de capacitar gestores de CRAS, estabelecer protocolos de ação e medir frequentemente o desempenho das unidades de atenção básica de assistência social.  E publicar tais avaliações de modo a divulgar melhores práticas.

      Até a próxima “Carta do Imds”!

 

        Paulo Tafner

        Diretor-presidente


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Enviado por Instituto Mobilidade e Desenvolvimento Social – Imds

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